Biocarvões são materiais ricos em carbono que vêm da carbonização de resíduos orgânicos, como restos de plantações, resíduos de madeira, restos de animais e até lixo urbano. Esse processo, chamado pirólise, transforma esses resíduos em um material carbonizado que pode ser usado na agricultura, principalmente para melhorar o solo e ajudar a reduzir a emissão de gases do efeito estufa.
Diferentes tipos de resíduos resultam em biocarvões diferentes, com variações nos nutrientes que eles contêm, porque cada resíduo orgânico tem uma composição química única. Essa composição afeta diretamente os tipos e as quantidades de nutrientes presentes no biocarvão produzido. Alguns resíduos têm mais nutrientes do que outros. No Brasil, por exemplo, a produção de café e eucalipto gera resíduos como a palha de café e a casca de eucalipto, que podem ser usados para produzir biocarvão. Esses materiais, porém, têm diferenças na quantidade de nutrientes, como mostra a tabela abaixo (Fonte: Estudo experimental conduzido em 2023 pela Universidade Federal do Brasil):
Biochar Material | Temperature | K Content (kg/t) | Ca Content (kg/t) |
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Coffee Husk | 350°C | 44.57 | 16.70 |
Coffee Husk | 600°C | 56.57 | 23.23 |
Eucalyptus Bark | 350°C | 5.66 | 26.36 |
Eucalyptus Bark | 600°C | 7.01 | 33.11 |
Por que biocarvões de palha de café têm mais potássio?
A palha de café, mesmo antes de ser transformada em biocarvão, já é conhecida por ter bastante potássio (K), devido ao fato de que o potássio é amplamente acumulado nas folhas e frutos do cafeeiro, onde participa de várias funções essenciais, como o transporte de açúcares e o controle da abertura dos estômatos. O potássio é um nutriente muito importante para o crescimento das plantas, ajudando em processos como a fotossíntese, o transporte de água e nutrientes, e o controle da abertura dos estômatos (fundamental para processos de transpiração e trocas gasosas).
No cafeeiro, o potássio é essencial para mover os açúcares produzidos nas folhas para outras partes da planta, como os grãos de café. Esse transporte de carboidratos ajuda a melhorar a qualidade dos frutos e o sabor do café. Assim, a grande quantidade de potássio na palha de café acaba também se refletindo no biocarvão produzido a partir dela, principalmente quando o processo de pirólise acontece a temperaturas mais altas.
Por que biocarvões de casca de eucalipto têm mais cálcio?
O acúmulo de cálcio (Ca) na casca do eucalipto (e em menor grau na palha de café) está ligado às funções estruturais desse nutriente na planta. O cálcio é muito importante para formar e manter as paredes celulares, se ligando às pectinas e criando uma estrutura rígida que dá força para as células e tecidos da planta. No eucalipto, a casca precisa ser bem resistente para lidar com o vento, a chuva e as variações de temperatura, e o cálcio é essencial para garantir essa resistência.
Além disso, o cálcio é um nutriente que não se move muito dentro da planta. Quando é depositado em uma parte da planta, como a casca, ele tende a ficar ali, pois está mais envolvido em dar estrutura do que em participar de processos metabólicos. Isso explica por que a casca de eucalipto, mesmo depois de passar pela pirólise, ainda é mais rica em cálcio quando comparada a outros biocarvões.
Conclusões finais
Os biocarvões feitos a partir de diferentes resíduos orgânicos têm diferentes quantidades de nutrientes, dependendo das características dos materiais de origem. A palha de café, que é rica em potássio, gera um biocarvão com alto teor desse nutriente. Enquanto isso, a casca de eucalipto, que é rica em cálcio, produz um biocarvão mais rico em cálcio. Essas e outras diferenças (teor de carbono, capacidade de troca catiônica, densidade, porosidade, etc.) fazem com que cada tipo de biocarvão tenha características únicas, trazendo vantagens específicas para alterar diferentes atributos químicos, físicos e biológicos de solos agrícolas.
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Sobre o autor
Danilo (daniloas.com), entre outras atividades, atuou como Professor de Bioquímica na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) entre 2022 e 2024, ministrando aulas teóricas e práticas para alunos dos cursos de Biologia, Nutrição, Farmácia, Agronomia, Zootecnia, Engenharia Florestal, Engenharia de Alimentos e Química. Neste blog, escreve sobre temas que conectam a bioquímica ao cotidiano e aos desafios enfrentados pelos futuros profissionais dessas áreas."